Convênio: MUNICÍPIO x UNIÃO - Parte 2 - Cursos preparatórios para concursos | Themas Cursos ®

Blog

Convênio: MUNICÍPIO x UNIÃO - Parte 2

Continuação...

Dica do Coach: Os Tribunais de Contas, em geral, fiscalizam todas as fases de convênio: celebração, formalização, execução e prestação de contas. Por isso, durante o julgamento das prestações de contas dos convênios, são proferidos dois juízos de mérito distintos: sobre a legalidade do ajuste e a regularidade das contas. Assim, a Corte de Contas analisa se o convênio celebrado atendeu a todas as formalidades legais para o seu ajuste, proferindo decisão sobre a sua legalidade ou ilegalidade, bem como analisa se os recursos repassados foram executados de maneira adequada, proferindo decisão sobre a regularidade das contas, regularidade das contas com ressalvas ou irregularidade.

Além de violação ao princípio do devido processo legal, o Município de Campinas ainda pode arguir violação ao princípio da intranscendência subjetiva das sanções, que impede que sanções e restrições de ordem jurídica superem a dimensão estritamente pessoal do infrator, alcançando todos os cidadãos vinculados ao ente federativo.

No caso narrado pelo enunciado, é possível perceber que a irregularidade quanto à ausência da prestação de contas ocorreu na gestão anterior, não podendo o novo Prefeito e os munícipes serem penalizados pelos atos do antigo gestor. Assim, o princípio da intranscendência subjetiva das sanções proíbe a aplicação de sanções às administrações atuais por atos de gestão praticados por administrações anteriores.

Também já manifestação do STF sobre o tema:

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NA AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. FINANCEIRO. TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. INSCRIÇÃO DE ESTADO-MEMBRO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. ATOS DECORRENTES DE GESTÕES ANTERIORES. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INTRANSCENDÊNCIA SUBJETIVA DAS SANÇÕES. PRECEDENTES. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO COLEGIADO. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O princípio da intranscendência subjetiva das sanções, consagrado pela Corte Suprema, inibe a aplicação de severas sanções às administrações por ato de gestão anterior à assunção dos deveres Públicos. Precedentes: ACO 1.848-AgR, rel. Min. Celso Mello, Tribunal Pleno, DJe de 6/11/2014; ACO 1.612-AgR, rel. Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, DJe de 12/02/2015. 2. É que, em casos como o presente, o propósito é de neutralizar a ocorrência de risco que possa comprometer, de modo grave e/ou irreversível, a continuidade da execução de políticas públicas ou a prestação de serviços essenciais à coletividade. 3. A tomada de contas especial é medida de rigor com o ensejo de alcançar-se o reconhecimento definitivo de irregularidades, permitindo-se, só então, a inscrição do ente nos cadastros de restrição ao crédito organizados e mantidos pela União. Precedentes: ACO 1.848-AgR, rel. Min. Celso Mello, Tribunal Pleno, DJe de 6/11/2014; AC 2.032, Rel. Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, DJe de 20/03/2009. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (ACO 1393 AgR, Relator(a):  Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 09/06/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-126 DIVULG 29- 06-2015 PUBLIC 30-06- 2015)

Aqui deve ser feita uma ressalva; o Município, além de arguir a violação ao princípio da intranscendência subjetiva das sanções, deve demonstrar que foram adotadas as medidas cabíveis para responsabilização do gestor que ensejou a restrição no CAUC. Há súmula do Advocacia Geral da União acompanhando esse entendimento:

SÚMULA Nº 46, DE 23 DE SETEMBRO DE 2009
"Será liberada da restrição decorrente da inscrição do município no SIAFI ou CADIN a prefeitura administrada pelo prefeito que sucedeu o administrador faltoso, quando tomadas todas as providências objetivando o ressarcimento ao erário."

Obs.: Veja outros casos de aplicação do princípio da instranscendência subjetiva das sanções envolvendo o CAUC:
(...) O postulado da intranscendência impede que sanções e restrições de ordem jurídica superem a dimensão estritamente pessoal do infrator. Em virtude desse princípio, as limitações jurídicas que derivam da inscrição, em cadastros públicos de inadimplentes, das autarquias, das empresas governamentais ou das entidades paraestatais não podem atingir os Estados-membros, projetando, sobre estes, consequências jurídicas desfavoráveis e gravosas, pois o inadimplemento obrigacional – por revelar-se unicamente imputável aos entes menores integrantes da administração descentralizada – só a estes pode afetar.

Os Estados-membros e o Distrito Federal, em consequência, não podem sofrer limitações em sua esfera jurídica, motivadas pelo só fato de se acharem administrativamente vinculadas a eles as autarquias, as entidades paraestatais, as sociedades sujeitas a seu poder de controle e as empresas governamentais alegadamente inadimplentes e que, por tal motivo, hajam sido incluídas em cadastros federais (CAUC, SIAFI, CADIN, v.g.). (...) (STF. Plenário. ACO 1848 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 06/11/2014)

____________________________________________________________________

Se um consórcio público celebrou convênio com a União por meio do qual estão previstos repasses federais, o fato de um dos entes integrantes do consórcio possuir pendência inscrita no CAUC não pode impedir que o consórcio receba os valores prometidos. Isso porque o consórcio público é uma pessoa jurídica distinta dos entes federativos que o integram e, segundo o princípio da intranscendência das sanções, as punições impostas não podem superar a dimensão estritamente pessoal do infrator, ou seja, não podem prejudicar outras pessoas jurídicas que não sejam aquelas que praticaram o ato. Assim, o fato de ente integrante de consórcio público possuir pendência no Serviço Auxiliar de Informações para Transferências Voluntárias (CAUC) não impede que o consórcio faça jus, após a celebração de convênio, à transferência voluntária a que se refere o art. 25 da LC 101/2000. STJ. 2ª Turma. REsp 1.463.921-PR, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 10/11/2015 (Info 577).

Por fim, o Município de Campinas pode alegar que a inscrição no CAUC não tem o condão de afastar a celebração de convênio com a União que tem como fim reformar e ampliar os leitos do Hospital Municipal. Isso, porque o art. 25, § 3º, da Lei de Responsabilidade Fiscal prevê que mesmo com restrições, o ente poderá receber transferências voluntárias relacionadas ações na área de saúde:

Art. 25. Para efeito desta Lei Complementar, entende-se por transferência voluntária a entrega de recursos correntes ou de capital a outro ente da Federação, a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira, que não decorra de determinação constitucional, legal ou os destinados ao Sistema Único de Saúde.

§ 1º São exigências para a realização de transferência voluntária, além das estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias:

§ 3º Para fins da aplicação das sanções de suspensão de transferências voluntárias constantes desta Lei Complementar, excetuam-se aquelas relativas a ações de educação, saúde e assistência social.

c) Caso a ação seja julgada procedente, indique quais as exigências legais devem ser obedecidas para que o Município de Campinas faça jus a celebração do convênio.

A celebração de convênios entre os entes públicos está relacionada a possibilidade de realização de transferências voluntárias entre si. O art. 25 da Lei de Responsabilidade Fiscal, inclusive, já apresenta o conceito de transferências voluntárias:

Art. 25. Para efeito desta Lei Complementar, entende-se por transferência voluntária a entrega de recursos correntes ou de capital a outro ente da Federação, a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira, que não decorra de determinação constitucional, legal ou os destinados ao Sistema Único de Saúde.

A transferência voluntária é, portanto, mera liberalidade dos entes públicos, que podem ou não, a partir de juízo de discricionariedade, ante a ausência de determinação legal, repassar recursos para outros entes com o fim de promover ações de caráter cooperativo, auxiliar e assistencial.

A própria LRF condiciona os requisitos que devem ser observados para que os entes promovam transferências voluntárias entre si no seu art. 25, § 1º:

§ 1o São exigências para a realização de transferência voluntária, além das estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias:

I - existência de dotação específica;
II -  (VETADO)
III - observância do disposto no inciso X do art. 167 da Constituição;
IV - comprovação, por parte do beneficiário, de:
 a) que se acha em dia quanto ao pagamento de tributos, empréstimos e financiamentos devidos ao ente transferidor, bem como quanto à prestação de contas de recursos anteriormente dele recebidos;
  b) cumprimento dos limites constitucionais relativos à educação e à saúde;
 c) observância dos limites das dívidas consolidada e mobiliária de operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, de inscrição em Restos a Pagar e de despesa total com pessoal;
  d) previsão orçamentária de contrapartida.

Assim, para a celebração do convênio com a União, o Município de Campinas deve comprovar que atende a todos os requisitos previstos no art. 25, § 1º da LRF que, como já foi dito, são sistematizados e verificados através do CAUC, no âmbito federal.

Dica do Coach: Existem três tipos de transferências: 1) Obrigatórias ou constitucionais; 2) voluntárias; 3) automáticas. Harrison Leite (LEITE, Harrison. Manual de Direito Financeiro. Salvador: Juspodivm, 2014, fls, 267-275) sistematiza tais transferências da seguinte maneira:
1. Transferências Obrigatórias: Trata-se de recurso que o constituinte determinou o seu repasse, para equilibrar a distribuição das receitas públicas, e diz respeito à ‘sobrevivência’ do próprio ente beneficiado. A exemplo, 50% dos valores arrecadados a título de IPVA, tributo estadual, são repassados para os municípios. Como dito, essas transferências são geralmente voltadas à manutenção do próprio ente federativo, servindo como fonte para pagamento de despesas correntes. No entanto, nada impede que o ente faça investimentos com os recursos recebidos de transferências obrigatórias, muito embora mais comum é tais investimentos serem financiados com recursos advindos das transferências voluntárias

2. Transferências Voluntárias: O seu conceito vem delimitado na lei, que considera como transferência voluntária a entrega de recursos correntes ou de capital a outro ente da Federação, a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira, que não decorra de determinação constitucional, legal ou os destinados ao Sistema Único de Saúde.

3. Transferências Automáticas: Embora presentes na Administração, são menos faladas em virtude da confusão existente com as transferências voluntárias. Na verdade, as transferências automáticas são resultantes de previsão legal ou de ato administrativo (geralmente portarias dos Ministérios) e são destinadas a custear serviços públicos e programas, no mais das vezes da área social, como saúde, educação e assistência social. A sua efetivação independe da existência de convênio, ajuste, contrato ou outro instrumento de formalização, bastando que o pretenso beneficiário tenha se habilitado junto ao Ministério respectivo, mediante o preenchimento de certas condições. Em alguns casos, como saúde, em que os recursos transitam entre fundos legalmente previstos (nacional, estadual, municipal), tais transferências podem ser chamadas de fundo a fundo, sem que haja diferença essencial entre elas e as transferências automáticas.

_____________________________________________________________________________________________

Gostou da exposição sobre o tema? Saiba que temos muito mais a lhe oferecer no Coaching Extensivo PGE. Para se matricular, clique aqui.

Sobre o Autor

Maíra Mutti Araújo

Procuradora do Estado do Pará. Criadora do método "Ask to Remember", que aborda técnicas de estudos para concurso com foco em neurociência. Aprovada na DPE/SE. Coautora do livro "Curso de Peças e Pareceres - Advocacia Pública - Teoria e Prática" pela Editora JusPodivm.