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Quiz 31

Roberto é proprietário de um pequeno imóvel urbano onde reside na cidade de Palmas. No ano corrente, seu vizinho, Juarez, construiu um grande imóvel residencial que culminou no encravamento do imóvel de Roberto, bloqueando o acesso deste a lugares públicos, em especial à via pública que passa pelo local. Considerando a situação hipotética acima aventada, discorra sobre o instituto de direito civil aplicável ao caso, apresentando três características que o diferenciam do instituto de direito civil que seria aplicável caso o imóvel não tivesse ficado encravado, mas, por conveniência de acesso à via pública que passa pelo local, Roberto houvesse acordado com Juarez a possibilidade de transitar em local estabelecido na propriedade do vizinho.

O instituto jurídico que se aplica à primeira hipótese do enunciado se chama “passagem forçada” e está previsto no art. 1.285 do Código Civil, a seguir transcrito:

Da Passagem Forçada

Art. 1.285. O dono do prédio que não tiver acesso a via pública, nascente ou porto, pode, mediante pagamento de indenização cabal, constranger o vizinho a lhe dar passagem, cujo rumo será judicialmente fixado, se necessário.

§ 1 o  Sofrerá o constrangimento o vizinho cujo imóvel mais natural e facilmente se prestar à passagem.

§ 2 o  Se ocorrer alienação parcial do prédio, de modo que uma das partes perca o acesso a via pública, nascente ou porto, o proprietário da outra deve tolerar a passagem.

§ 3 o  Aplica-se o disposto no parágrafo antecedente ainda quando, antes da alienação, existia passagem através de imóvel vizinho, não estando o proprietário deste constrangido, depois, a dar uma outra.

 

            A passagem forçada consiste em restrição ao direito de propriedade decorrente das relações de vizinhança, tendo por fundamento a função social da propriedade, nos termos do art. 5.º, incs. XXII e XXIII, da CF/1988 e do art.1.228, § 1.º, do Código Civil.

            Isso porque, se não houvesse a passagem, o imóvel encravado 1 não teria qualquer finalidade social.

            No ponto, cumpre destacar que, de acordo com doutrina 2 e jurisprudência, o conceito de imóvel encravado não deve ser visto de forma absoluta, sem qualquer flexibilidade.

            Nesse sentido, foi aprovado o Enunciado nº 88 do CJF/STJ, na I Jornada de Direito Civil, in verbis:

O direito de passagem forçada, previsto no art. 1.285 do CC, também é garantido nos casos em que o acesso à via pública for insuficiente ou inadequado, consideradas, inclusive, as necessidades de exploração econômica.

            No mesmo sentido já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça:

Civil. Direitos de vizinhança. Passagem forçada (art. 559 [do CC/1916]). Imóvel encravado. Numa era em que a técnica da engenharia dominou a natureza, a noção de imóvel encravado já não existe em termos absolutos e deve ser inspirada pela motivação do instituto da passagem forçada, que deita raízes na supremacia do interesse público; juridicamente, encravado é o imóvel cujo acesso por meios terrestres exige do respectivo proprietário despesas excessivas para que cumpra a função social sem inutilizar o terreno do vizinho, que em qualquer caso será indenizado pela só limitação do domínio. Recurso especial conhecido e provido em parte. (STJ, REsp 316.336/MS, 3.ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, j.18.08.2005, DJ 19.09.2005, p. 316).

             A respeito da efetivação da passagem forçada, sofrerá o constrangimento o vizinho cujo imóvel mais natural e facilmente se prestar à passagem  (art. 1.285, § 1.º, do CC), Seguindo-se a ideia - que já constava da codificação anterior - no sentido de que a passagem forçada deve ser instituída da maneira menos gravosa ou onerosa aos prédios vizinhos (princípio da menor onerosidade).

            Adendo: Além da imposição da passagem forçada, o CC/2002 trata, de forma semelhante, da passagem de cabos e tubulações. Nos termos do art. 1.286 do CC, mediante recebimento de indenização que atenda, também, à desvalorização da área remanescente, o proprietário é obrigado a tolerar a passagem, por meio de seu imóvel, de cabos, tubulações e outros condutos subterrâneos de serviços de utilidade onerosa.

           Tal passagem, do mesmo modo, está baseada na função social da propriedade, havendo um interesse público indireto, pois as passagens de cabos e tubulações atendem aos interesses de outras pessoas e da coletividade. Esse regime jurídico de obrigatoriedade é similar ao da passagem forçada, oque justifica a proximidade legislativa. (TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil – volume único. 7ª Ed., Editora Método, 2017).

             Ressalte-se que a passagem forçada também é conhecida como “servidão legal”, não se confundindo com o direito real de servidão (art. 1.378 e seguintes do Código Civil – recomenda-se a leitura de tais dispositivos), que é justamente o instituto jurídico objeto da segunda hipótese contida no enunciado.

            Sobre o direito real de servidão, veja-se:

É um direito real na coisa alheia que impõe que determinado gravame em um imóvel (prédio serviente) em favor de outro (prédio dominante), proporcionando melhor utilidade ao
último. Nessa linha, se por um lado as servidões prediais proporcionam uma valorização do prédio dominante, resultam em uma desvalorização econômica do prédio serviente.

Exigem que ocorram entre prédios diferentes e pertencentes a titulares diversos. Se pertencer ao mesmo titular, não vais er direito real na coisa alheiam configurando-se mera serventia ou aproveitamento de coisa própria.

A relação estabelecida é de direito real, e não pessoal, sendo que serve à coisa e não ao titular. Ou seja, necessariamente ele ocorre entre prédios e não entre os titulares do prédio, sendo que o direito do titular da servidão está vinculado à sua relação de domínio que ele tem com o prédio dominante e enquanto durar esta, não tendo qualquer relação com sua pessoa.

É justamente por não servir ao titular, mas sim ao prédio, que se faz mister destacar que a servidão adere à coisa (aderência), e não ao dono. Acompanha, portanto, o imóvel
de forma perpétua, pouco importando quem será o seu titular, tendo oponibilidade contra todos (erga omnes).

Atente que apesar de não poder se falar em alienação da servidão (inalienabilidade), é possível que o prédio, tanto o dominante quanto o serviente, venham a ser alienados.
Porém, como afirmado, a servidão irá seguir esse bem, permanecendo, sendo essa a característica da aderência dos direitos reais.

Por fim, lembre-se futuro aprovado, que a servidão não se presuma, necessitando ser constituída expressamente, seja por ato inter vivos (contrato – bilateral) ou mortis causa (testamento – unilateral), desde que seguido do competente registro, o qual possibilitará eficácia erga omnes e aderência.

             Bem delineados os institutos jurídicos trazidos no enunciado da questão, passa-se às suas principais distinções:

               (i) em primeiro lugar, a passagem forçada é instituto de direito de vizinhança, consistindo numa obrigação ambulatória ou proptem rem, ao passo que a servidão constitui um direito real de gozo ou fruição;

                (ii) a passagem forçada decorre da lei, razão pela qual não precisa de registro; por outro lado, o direito real de servidão precisa de registro para que produza efeitos quanto a terceiros.

          (iii) ademais, a passagem forçada é obrigatória, diante da função social da propriedade; as servidões, por sua vez, são facultativas. Em outras palavras, na passagem forçada (servidão legal) há interesse social, enquanto no direito real de servidão há interesse predominantemente privado, de forma que as partes visam atender suas conveniências;

            (iv) na passagem forçada há necessariamente o pagamento de uma indenização ao imóvel serviente, enquanto que nas servidões a indenização somente será paga se houver acordo entre os proprietários dos imóveis envolvidos;

               (v) Na passagem forçada, o imóvel não tem outra opção que não seja a passagem; o que não ocorre nas servidões;

               (vi) Flávio Tartuce 4 traz ainda uma distinção quanto ao aspecto processual: de um lado há a ação de passagem forçada; do outro, a ação confessória, fundada em servidões. O aludido autor pontua, no entanto, que “as expressões que denominam as demandas são doutrinárias, o que deve ser mantido na emergência do Novo CPC”.

               A seguir, tabela 5 que sistematiza as diferenças entre os institutos tratados na questão ora comentada:


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